quinta-feira, 28 de julho de 2011

" Os doutores da alegria "

Era uma manhã de sábado ensolarada e eu estava ali, bem cedo, na enfermaria de pediatria. Tudo estava perfeitamente calmo e silencioso, algumas enfermeiras andavam de um lado pro outro olhando fixamente para a planilha que carregavam nas mãos. Entre um parágrafo e outro do livro que estudava, lança-va um olhar rasteiro numa criança careca que estava sentada no leito, brincando com um carrinho azul que empurrava tediosamente para frente e para traz. De repente um som familiar veio pelo corredor, algo que eu não ouvia ha algum tempo. Sim, eram eles, os “ doutores da alegria”. Uma mulher de aproximadamente 30 anos, cabelo curto e um homem de meia idade e de cabelo grisalho. Eles vestiam um jaleco engraçado, um nariz de palhaço e andavam tocando um violão. O sombrio e frio clima daquele nosocômio foi quebrado instantaneamente. O garotinho careca parecia não acreditar, abriu um sorriso enorme, quase que incompatível com a realidade pesada que o cercava. Entre brincadeiras e músicas engraçadas, a mulher de cabelo curto pergunta: - O que você vai ser quando crescer, rapaz? – E ele responde numa fração de segundo: - Caminhoneiro. - E o assunto se estende.
Um pouco depois os doutores foram embora, as risadas, a música, tudo tinha passado. O velho silêncio voltava a imperar na enfermaria, trazendo de volta o tom cinza do triste destino que cercava o menino careca. Percebi então que lia o mesmo parágrafo várias vezes, incomodado com alguma coisa naquele ambiente. Lancei um outro olhar e percebi que o garotinho careca carregava um sorriso no canto da boca, e voltava a empurrar o carrinho azul fazendo curvas no lençol, provavelmente sonhando com o seu futuro de sucesso. Três semanas depois, esse garotinho faleceu de leucemia.
Outro dia, ao encontrar com os doutores da alegria, pergunto, prepotentemente, como quem já soubesse a resposta: - Vocês são cristãos? - E ouço uma resposta seca, como uma martelada no meu ego evangélico: - Não, por quê? Precisa ser?



“ Então os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? Ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? Ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te? E, respondendo o Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes. “ (Mateus 24)

3 comentários:

  1. existe um pouco desse "ego evangélico" dentro de cada um de nós... e nos impede de enxergar a simplicidade de ser cristão, fazer o bem ao próximo e agradar a Deus. Ótima reflexão.

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  2. Otima reflexão² :D

    Gostei daqui Matheus, to seguindo!
    http://fragmentosnostalgicos.blogspot.com/


    beeijo :*

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  3. Sabe quando a gente ganha o dia com uma leitura? Então...

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